Terça-feira, 31 de Outubro de 2006
Cada vez me interesso menos pela televisão. Vejo o telejornal, uns documentários sobre bichos, ocasionalmente uma série ou outra, e pouco mais.
Hoje, e como habitualmente, liguei-a enquanto jantava, e "apanhei" na RTP-2 um episódio de uma série intitulada "Perto de Casa", definida como um "drama com toques de suspense, que mostra de maneira convincente os subúrbios americanos através dos olhos de uma jovem advogada" (ou, mais propriamente, uma assistente do "prosecutor" americano)
Neste episódio, a tal jovem "prosecutor" "faz uma grande aposta quando nega a um suspeito de sequestro o direito de ter um advogado presente enquanto é interrogado, na tentativa de o forçar a confessar o crime e permitir que ele leve a polícia até ao (local do) cativeiro e a vítima seja levada viva para casa."
Fiquei a saber que nos EUA o "prosecutor" pode recusar a um suspeito a assistência por advogado, sendo que a sanção para tal comportamento é a nulidade da prova obtida através de confissão, feita nestas condições. Isto implica que qualquer futura acusação desse suspeito terá de ser suportada por outra prova, designadamente a que vier a ser obtida através do depoimento da vítima.
Não sei até que ponto esta ficção se aproxima da realidade americana. O que achei interessante foi o facto de se associar a assistência por advogado à impossibilidade de convencer o suspeito a revelar o paradeiro da vítima.
Em Portugal, tendo em consideração as regras deontológicas da profissão, seria de esperar o contrário, ou seja, que o suspeito fosse mais facilmente convencido a revelar o paradeiro da vítima caso estivesse assistido por advogado.
O complicado de tudo isto é que na televisão portuguesa só passam séries americanas...
Domingo, 29 de Outubro de 2006
Há uns dias li, no Correio da Manhã,
esta notícia, na qual se referia que
"a um ano e dois meses das eleições na Ordem dos Advogados, há já vários movimentos de apoio a grandes nomes da advocacia portuguesa para sucederem a Rogério Alves. José António Barreiros, José Pedro Aguiar Branco e Daniel Proença de Carvalho encabeçam as preferências dos maiores grupos de causídicos que, divididos nos bastidores, já fazem contactos e recolhem apoios".
Hoje, ao fazer a minha habitual "ronda" pelos meus blogs favoritos, vi
este "post" no "Patologia Social" e concluí que há por aí quem esteja desesperadamente à procura de candidato... :-)
Ontem, sábado, encontrei no Público, sob o título
"Vice-presidente dos EUA defende simulação de afogamento", a seguinte notícia:
"O vice-presidente dos Estados Unidos, Dick Cheney, disse não ver problemas nenhuns nalgumas formas de tortura como a simulação de afogamento, afirmação recebida com protestos pela Human Rights Watch. Um perito da ONU considerou ontem que nova lei antiterrorismo americana viola tratados internacionais.
Numa entrevista a uma rádio, o "número dois" da Administração concordou que a sujeição de um prisioneiro a um "mergulho na água" não tem "qualquer problema", se puder salvar vidas. Mais disse que a técnica foi uma "ferramenta muito importante" contra alguns detidos da Al-Qaeda como Khalid Sheikh Mohammaed, não constituindo do seu ponto de vista uma forma de tortura.
Os comentários de Cheney sobre a legalidade da simulação de afogamento contradizem os pontos de vista do Congresso e do Departamento de Defesa, bem como os princípios fundamentais do direito internacional, protestou a Human Rights Watch (HRW).
"Se o Irão ou a Síria detiverem um norte-americano, o que Cheney está a dizer é que podem sem problema mantê-lo debaixo de água até ao ponto do afogamento, se com isso acharem que podem salvar vidas de iranianos ou sírios", disse Tom Malinowski, responsável pelos serviços jurídicos da HRW.
A simulação de afogamento é uma técnica de tortura que remonta à Inquisição. Foi usada por algumas das mais cruéis ditaduras do mundo, incluindo a dos Khmer Vermelhos no Camboja e de Pinochet no Chile. Numa das versões a vítima é atada e a cabeça coberta por um sino ou um saco, no qual é metida água até ao ponto de afogamento, noutra a cabeça é mergulhada num tanque.
Um perito de direitos humanos da ONU, Martin Sheinin, afirmou, citado pela AP, que as novas leis antiterrorismo assinadas há duas semanas pelo Presidente dos EUA, George W. Bush, violam vários tratados internacionais.
Segundo o especialista, a Military Commissions Act "tem um conjunto de provisões incompatíveis com as obrigações internacionais dos EUA ao abrigo das leis de direitos humanos e humanitárias."No
New York Times, e também sobre este assunto, encontrei
isto.
Ainda a propósito desta matéria, encontrei
esta entrevista ao Juiz norte americano Peter J. Messitte, que esteve em Portugal para fazer uma palestra sobre o sistema judicial americano e os direitos humanos.
Depois de ler tudo pensei cá para comigo que este mundo está a ficar muito esquisito...
Quinta-feira, 26 de Outubro de 2006
No seu discurso de tomada de posse, o novo Presidente do Conselho Superior da Magistratura afirmou que
"os tribunais só funcionarão - tenhamos bem essa noção - se houver a coragem política de os limpar do 'lixo processual' que tudo entope, agindo a montante deles e regulando o comportamento dos agentes no mercado da concessão de crédito ao consumo" (cfr.
aqui e a versão integral
aqui ).
E quem são esses poluidores do ambiente judicial que, nas palavras do Senhor Conselheiro ,
"vandalizam" os tribunais desde o Verão de 1987?
Foram, em primeiro lugar
"as seguradoras, e seguiram-se os leasings, as sfacs, os cartões de crédito, os telemóveis, a tv cabo, a netcabo e assim sucessivamente", ou seja, as grandes empresas que "alimentam" a sociedade de consumo em que hoje vivemos e que Portugal almejava atingir quando, em 1985, aderiu à Comunidade Europeia.
Ora, se a economia portuguesa é, hoje em dia, e por via da adesão à CE, uma economia de mercado e, pela mesma razão, a sociedade portuguesa é uma sociedade de consumo, que litígios espera o Senhor Conselheiro que se apresentem aos tribunais para serem derimidos, que não litígios de consumo, se não totalmente, pelo menos maioritariamente?
Ou será que aquilo que o Senhor Conselheiro pretende, ao dizer que o Estado deve
"agir a montante" e
"regular" o comportamento desses agentes económicos, é acabar com a sociedade de consumo?
A ser assim, e para atingir tal objectivo, afigura-se-me que vai precisar de muito mais que um lugar no Conselho de Estado. Acho mesmo que vai ter de fazer outro 25 de Abril... :-)
Quinta-feira, 19 de Outubro de 2006
Há quase um ano atrás, a Advogada e Formadora Teresa Alves de Azevedo traçou
aqui um retrato fiel do Advogado e Formador José Carlos Mira, "tombado em combate" no dia 29 de Novembro de 2005.
Nestes tempos das "reformas de Bolonha" e dos "troncos comuns", tenho-me lembrado muitas vezes do meu Querido General, que conheci ainda era estagiária, e em particular de um conselho que uma vez deu a uma novel patrona, sua antiga formanda, que o procurou, via CFO, buscando orientação.
Escreveu o Dr. Mira:
Se é a primeira vez que é "patrona" permita-me, em termos gerais dizer que lhe caberá transmitir ao seu estagiário os conhecimentos que adquiriu no exercício da profissão.
Mas, se me permite, não fique por aí: veja no estagiário aquilo que a Colega já foi. Tente recordar-se dos seus "medos", das suas "angústias", dos problemas que teve, das dificuldades que sentiu no seu tempo de estagiária.
Veja no estagiário um amigo mais novo que precisa da sua ajuda. Tenha o estagiário como um "compagnon de route" com o qual compartilha as suas próprias dificuldades, as suas vitórias e também as suas derrotas.
Digo-lhe mais, veja no estagiário alguém com quem nós também aprendemos. Pessoalmente assumo que o pouco "penal" e "processo penal" que sei o devo aos meus estagiários por compartilhar as vivências profissionais deles.
Tenha com o seu estagiário uma relação de "ensino/aprendizagem" mas permita-me que sugira que a "tempere" com uma relação "de afecto".Estou certa que ponderou todos estes aspectos quando, por volta do ano de 2002, decidiu convidar a Dra Teresa Alves de Azevedo para integrar a equipa de formadores de Prática Processual Civil.
A este propósito, também no CFO, escreveu:
Há coisas que devem ser ditas, e esta é uma delas.
Ainda não vos disse porque é que "requisitei" a Sra Dra TAA para o " meu grupo" de formação.
Aqui há pouco mais de dois anos passei a encontrar com impressionante regularidade uma "visitante" que aqui aparecia a esclarecer, com assinalável acerto e ponderação, e notável "amor à camisola", que assinava TAA e que o remetente me dizia chamar-se "Teresa Alves Azevedo"
Confesso que na altura "não liguei o nome à pessoa" e foi ela que "se apresentou" recordando-me ter litigado "contra mim" uns anos antes e recordando-me o caso em questão.
Devo dizer que, por razões que aqui não relevam, o caso em questão foi, inquestionavelmente, o de maior melindre deontológico que tive em toda a vida.
A Sra Dra TAA só teve intervenção na audiência de julgamento, razão pela qual não recordei de imediato o nome dela.
Devo dizer-vos, porém, que me impressionou a postura deontológica dela em toda a sua intervenção, apesar de ser uma jovem ( e ainda é ! ) Advogada com todo o "ar" de ter acabado o estágio há pouco tempo.
Foi um processo que decorreu num nível de intervenção deontológica de tal forma elevado que o próprio senhor juiz do processo fez questão de salientar este aspecto em várias passagens da sentença que proferiu. Nunca me tinha acontecido antes, nem voltou a acontecer depois.
Lembra-se, Teresa ?
Então ali estava alguém que manifestamente sabia muito de processo civil; manifestava total disponibilidade para ajudar quem precisava; explicava as coisas de maneira que até um menino de 5 aninhos percebia, e ainda por cima tinha revelado ser de um rigor deontológico marcante e eu não ia aproveitar?
É exactamente por isso que jamais pediria para dar formação aos colegas mais novos a alguém que entenda que um estagiário que copiou por uma minuta tem "todo o direito" de afirmar que não copiou!
E, digo eu, ainda bem que a convidou.
Mais que qualquer outro formador, a TAA ficou a segurar o "barco" dos nossos estagiários desde que ele partiu. Pedi-lhe, agora, para fazer um "balanço" deste ano "pós-Mira" e aqui vos deixo o que ela escreveu:
Está prestes a fazer um ano que faleceu o Senhor Dr. José Carlos Mira.Há momentos em que parece que foi ontem que falei com ele; e em muitas manhãs quase que espero encontrá-lo encostado ao balcão do Centro de Estágio.Não se passa um dia em que não me lembre dele, e lembro-me sempre com um misto de alegria por o ter conhecido e de tristeza por ele já não estar entre nós. Ao longo deste ano receei várias vezes que o legado dele se perdesse. Mas também várias vezes me apercebi de que o legado que nos deixou não morrerá enquanto existir alguém que se lembre dele e do que nos ensinou.Há um “antes” e um “depois” dele, que nos entra pelos olhos dentro quando abrimos o Fórum “Sala J.C. Mira” do CFO-CDL: as alterações introduzidas levaram a que o Fórum que está activo seja posterior ao falecimento dele, pelo que só se encontram as mensagens dele nos vários Arquivos, milhares de mensagens deixadas entre 2002 e 2005, a última das quais na hora anterior ao falecimento.O Dr. José Carlos Mira ensinou processo civil aos estagiários, mas foi também ele quem criou o espírito de entreajuda no CFO.Foi ele quem levou a que os estagiários (e não só) se juntassem “à mesa do Bar” do CFO de Lisboa, sabendo que do outro lado estava sempre alguém pronto a ajudar. E vinham de todos os cantos do mundo, até dos fiordes noruegueses.Foi ele quem ensinou, pelo exemplo, que quem sabe deve ajudar aqueles que sabem menos. E ensinou que quando se sabe um pouco mais se deve passar a ajudar.Ele ensinou a ajudar desinteressadamente, a receber um agradecimento com a alegria de ter ajudado…Este ano sem ele tem custado muito a viver.Mas quase todos os dias venho do CFO de alma lavada: encontrei alguém que anteontem pouco sabia, que ontem tinha dúvidas e que hoje ajudou alguém.Ao longo deste ano em que temos tentado manter o espírito dele, ali, naquela sala que é dele, fico quase em lágrimas quando me apercebo de como a “rapaziada” dele cresceu e se continua a lembrar dele.Verificam-se os progressos de dia para dia, à medida que os estagiários vão avançando no desempenho desta actividade que é a nossa, de ajudados passam a ajudar, e de curso em curso de estágio se vai renovando o legado deixado pelo Dr. Mira: Luís Miguel Jesus, Marta Susana Carvalho, Salomé Jardim, Tiago Castelo, Luís Mesquita Brito, Filipa de Figueiroa, Nelson Páscoa Silva, Bernardo Pinto Coelho, José Gabriel Pinto Coelho, José Barradas, Henrique Fialho, Marta Montez, Susana Valério, Susana Caço Dias, Rosário L. Afonso, Isabel Cabral Gomes, João Carlos Ludovico da Costa, Fátima Calado Pedro, Munir Valimamade, Miriam Soares, Carlos Marques Dias, Fernando Manuel Ramos, Luís Mesquita Martins, Marco Garrinhas, Alexandra Sécio, Marco Alexandre Saias …O legado dele está bem vivo e a chama continua acesa.
Teresa Alves de Azevedo
Diz o art.º 120.º da Lei n.º 15/2005, de 26 de Janeiro, mais conhecida por EOA, que o processo disciplinar, no qual seja visado um advogado, tem natureza secreta até ao despacho de acusação, sem prejuízo de o relator poder autorizar a consulta do mesmo pelo interessado ou pelo arguido, assim como determinar que as estes sejam facultadas cópias de peças processuais, para que se pronunciem sobre as mesmas, quando tal seja do interesse da instrução. Mediante requerimento que indique o fim a que se destina, pode ainda ser autorizada a passagem de certidão para defesa dos legítimos interesses dos requerentes.
Estabelece, ainda, o mesmo artigo, que
"o relator pode autorizar a informação pública de pendência de processo disciplinar contra advogado determinado, sem identificar os factos e a fase processual". O arguido e o interessado, quando advogado, que não respeitem a natureza secreta do processo incorrem em responsabilidade disciplinar.
A lei nada refere sobre a possibilidade da natureza secreta do processo não ser respeitada pelos membros do Conselho de Deontologia competente, mas a ser verdade o que li
aqui parece-me que devia...
Domingo, 15 de Outubro de 2006
Nos últimos tempos tenho encontrado nos jornais vários textos, de vários autores, quase todos advogados, defendendo a ideia de que a advocacia já não é como antes, e que os advogados de hoje estariam melhor representados por uma "agência de regulação e fiscalização independente" ou por um sindicato, do que pela sua provecta Ordem, velha de oitenta anos.
Começou com
este texto, que suscitou
esta única resposta, a propósito dos quais já escrevi
isto.
Continuou, depois, com
este outro e ainda
este , publicados imediatamente antes da realização da Assembleia Geral Extraordinária dos Advogados, convocada
neste contexto, e na qual se aprovou
isto e pouco mais.
Na passada quarta feira da semana que agora finda, foi publicado mais um, na "Lex" do Jornal de Negócios, desta vez sob a forma de entrevista ao Dr. Macedo Vitorino (na foto), que peremptóriamente afirma que a Ordem dos Advogados
"é um vazio" e que
"devia acabar", aproveitando ainda para criticar os membros da Ordem, por
"irem à televisão autopromover-se, (...) (e dar) entrevistas sobre casos dos quais eles não são advogados, com a desculpa de que são da OA".
Nem de propósito, no dia em que foi publicada esta entrevista, os advogados ficaram a saber
isto.
Tenho de reconhecer, no entanto, que a ideia de acabar com a Ordem não é recente.
Recordo a indignação do Bastonário Pires de Lima, a propósito de umas certas propostas de lei que visavam retirar poderes às ordens profissionais.
Mais tarde, na altura em que se iniciaram os trabalhos de revisão do velho Estatuto da OA, foi publicado
este texto na Revista, que mereceu do Bastonário José Miguel Júdice o seguinte comentário:
"Estão sempre em confronto duas concepções de advocacia : uma mais anglo-saxónica, em que a organização dos advogados é uma instituição da sociedade civil, sem os direitos nem os deveres decorrentes de funções públicas; outra mais continental em que se insere a tradição da nossa Ordem. O texto do Dr. Rangel exprime uma concepção perfeitamente legítima e totalmente liberal da profissão : para vos dar um exemplo, a Law Society de Inglaterra e Gales defende que é admissível que empresas abram em supermercados gabinetes de consulta jurídica. Sou um reformista e fui muito atacado - creio que injustamente - de querer destruir a Profissão. A Advocacia em Inglaterra é muito poderosa, mas não se iludam que não tem os valores que nos caracterizam. O meu modelo não é o inglês e não fui eleito para o concretizar.(...) José Miguel Júdice, 2002-11-21 (cfr.
aqui ).
Que eu saiba, e até ver, foi o último Bastonário a proferir tal afirmação, e é manifesto que há quem esteja a aproveitar isso.
A bem da profissão e dos advogados, só posso desejar que o próximo ainda chegue a tempo...
Quinta-feira, 12 de Outubro de 2006
"Programa para compreender a Justiça" é o título da notícia que podem ler
aqui.
"Questões como a morosidade dos tribunais, os custos de um processo ou as escutas telefónicas serão esclarecidas pelo programa "Justiça na Ordem", que a SIC Notícias estreia na segunda-feira.
Trata-se de uma iniciativa do canal do cabo em parceria com a Ordem dos Advogados (OA) e a livraria Almedina que tem como objectivo aproximar os cidadãos da Justiça.
Em cada emissão, a jornalista Teresa Pina e o bastonário da OA, Rogério Alves, abordam os temas de forma simples e sintética de modo a que as pessoas conheçam melhor os seus direitos e os seus deveres."Até à estreia do novo programa o cidadão mais ingénuo tem ao seu dispor as recomendações amigas, que encontra à entrada do "site-falante" da OA (cfr.
aqui)
Perdoem que não comente mas, chegados a esta fase, tenho de admitir que o desânimo é tanto que já perdi a vontade...
Quarta-feira, 11 de Outubro de 2006
Este anúncio (do qual omiti dois números de telefone que se encontravam na parte inferior) foi publicado hoje, num daqueles jornais gratuitos, distribuídos no metro e nos comboios.
O formato é igual àquele que também se usa nos anúncios do tipo "
menina procura cavalheiro para assunto sério" ou "
linda, trintona, apartamento com suites" e a meu ver esse é o aspecto mais "impressivo" quando se lê. O problema não é tanto a circunstância de alguém se oferecer para prestar estes serviços, mas antes o "oferecer-se" desta maneira e em "sítios" que são uma espécie de "trottoir" em letra de imprensa, pelo que só a ideia do anunciante configurar a hipótese de alguém procurar um advogado nestes "sítios" me parece estranha.
Depois, no mesmo dia, encontrei uma outra manifestação do que aparenta ser o mesmo problema, mas que, por estar tão nos antípodas do primeiro, eu não tenho a certeza que seja. Refiro-me a
esta notícia do DE, na qual se refere que "
Escritórios usam ‘rankings’ para contornar estatuto da Ordem", designadamente, as regras sobre a publicidade.
Quando estudei economia, lembro-me de ouvir uma vez um professor definir o que se entendia por subdesenvolvimento. Dizia ele que para se perceber o funcionamento de uma economia subdesenvolvida bastava pensar em aquecer moderamente um corpo metendo os pés no fogão e deixando a cabeça no frigorífico. O mais que se conseguia era queimar os pés e gelar a cabeça...
E é esse ensinamento que me vem à memória sempre que me ponho a pensar nas muitas e díspares realidades, às quais é aplicável a regra sobre a publicidade, constante do art.º 89.º da Lei n.º 15/2005, de 26.01, mais conhecida por EOA.
Domingo, 8 de Outubro de 2006
Li
aqui que o Dalai Lama terá aconselhado o Papa Bento XVI a não comentar textos antigos, porque isso "dá complicações". Referia-se, naturalmente, à "aula" que o Papa deu, no passado dia 12 de Setembro, na Universidade de Regensburg, e na qual citou um excerto de uns diálogos, datados do final do Séc. XIV, entre o Imperador Bizantino Manuel II Paleólogo e um erudito persa, que suscitou reacções muito negativas entre os muçulmanos.
Admiro muito o Dalai Lama, que tenho na conta de um sábio muito pragmático, mas neste particular assunto não consigo concordar com ele.
Na minha modesta opinião, a "lição" do Papa, cuja leitura recomendo vivamente, é uma extraodinária reflexão sobre as duas principais matrizes do pensamento europeu, a saber, a grega e a cristã. Ao ler o texto poderão constatar, como eu, que aquilo que se afirma, por exemplo
aqui, mais não é que uma muito pouco "fiel" tradução de um excerto do discurso do Papa.
Encontram o texto integral, na versão inglesa,
aqui.
Sábado, 7 de Outubro de 2006
Jack Straw, antigo ministro britânico dos Negócios Estrangeiros, prefere ver a cara das mulheres que falam com ele (cfr.
aqui e
aqui).
Entendo-o. Eu também acho que olhar a cara de quem fala comigo, seja homem ou mulher, é essencial para estabelecer uma boa comunicação, razão pela qual não gosto de tratar certos assuntos pelo telefone.
Além disso, falar com alguém cuja face está velada coloca-nos em desvantagem relativamente a esse interlocutor e, muito francamente, não vejo por que razão um cidadão que vive deste lado do Mediterrâneo deverá aceitar conceder essa vantagem a outro cidadão como ele.
Parece que algumas inglesas muçulmanas se terão sentido insultadas com esta preferência do antigo ministro. Será que preferiam que este se tivesse recusado a falar com elas?
Muçulmanos, cristãos, budistas, hindus, xintoístas... todos somos filhos de Deus e todos vivemos em "Roma".
Ora, lá diz o ditado, "em Roma sê romana" :-)
Quarta-feira, 4 de Outubro de 2006
"O Direito deve servir a Justiça e (...)tal finalidade só é alcançada se houver independência, imparcialidade, competência e prudência na aplicação do Direito"(...). "O Direito não pode ser um produto de consumo, ditado por regras de mercado e condicionado por sondagens, manchetes, entrevistas ou fazedores de opinião" , afirmou o presidente da Escola de Direito da Universidade do Minho, prof. Luís Couto Gonçalves (cfr.
aqui).
Concordo. Alguém devia dizer isto ao Ministro, porque ele está a precisar de ouvir.
Domingo, 1 de Outubro de 2006
O DN publicou, na passada sexta-feira, dia 29, dois artigos sobre a Ordem dos Advogados (cfr.
aqui e
aqui) , o primeiro dos quais sobre uma alegada "inevitável cisão" e o outro sobre a maior ou menor influência dos seus bastonários "junto do poder".
No dia seguinte, na sessão de encerramento do 80.º aniversário da Ordem, o Bastonário Rogério Alves respondeu aos "profetas da desgraça" com optimismo, afirmando que
"os advogados são “um produto de inegável qualidade pública” e “garante do Estado de Direito”". O Secretário de Estado Adjunto e da Justiça confirmou que
“ninguém põe em causa a autonomia dos advogados no cenário geral da Justiça” (cfr.
aqui).
Apetece-me dizer ao Senhor Secretário de Estado, o que se dizia naquele velho anúncio televisivo: "pois olhe que não parece!"
A mim parece-me que o poder político está apostado em destruir as profissões liberais, tirando partido das dificuldades que estas atravessam (e que em grande parte foram criadas por esse mesmo poder) e da patente desorientação de quem as representa. Prova disto é esta tendência crescente de pôr as profissões a concorrer umas com as outras, sem respeitar as competências próprias de cada uma delas, e a falta de uma reacção adequada, por parte das respectivas ordens.
Entre os advogados, niguém nega a existência de dificuldades, a maioria das quais nem sequer são recentes.
Mas em vez de se procurar optimizar o que existe, os órgãos eleitos querem discutir com os associados a necessidade de alterar regras legais que foram aprovadas há pouco mais de um ano, com o contributo (real ou presumido) de muitas pessoas que, à data, já tinham responsabilidades na gestão da instituição e que hoje vêm dizer que, afinal, essas regras não servem.
E adianta-se como solução para os problemas a "profissionalização das estruturas", não se esclarecendo, todavia, "o quê", muito menos "o como", e dificilmente se descortinando "o porquê", sabendo-se, como se sabe, e no que respeita a recursos disponíveis, que os associados dificilmente terão condições para pagar quotas mais elevadas, sendo ainda conhecida a disposição do Estado em matéria de despesa pública.
Haverá desorientação mais evidente que esta?