Segunda-feira, 30 de Março de 2009
Na passada terça feira voltei à Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, a convite do Núcleo de Estudantes de Direito da respectiva Associação, para «conduzir» alguns alunos numa breve «visita guiada» aos terrenos da Retórica, essa arte antiga hoje em vias de extinção. Escrevo voltei porque, de certa forma, sinto-me ex-aluna, por ter frequentado, no início dos anos oitenta, o Curso de Estudos Europeus dessa mesma Faculdade. Depois, devo grande parte da minha formação civilista, na Faculdade de Direito de Lisboa da Universidade Católica do final dos anos setenta, aos grandes professores da Universidade de Coimbra, dos quais recordo em particular Antunes Varela, Ferrer Correia e Mota Pinto. Deles guardo a memória do que é o «saber total», um saber reflectido, organizado, um verdadeiro conhecimento, e não apenas um mero somatório de informação, desprovido de um sentido, indiferente a uma lógica interna. Vem isto a propósito das ideias que retive das minhas conversas com os estudantes de Coimbra durante a minha visita, na passada terça feira, e também do artigo que hoje encontrei no DN sobre a alegada dificuldade de adaptação das universidades portuguesas ao processo de Bolonha que, aliás, tem vindo a ser alvo de violenta contestação um pouco por toda a Europa, e ainda este mês, na vizinha Espanha. Perguntaram-me os estudantes o que penso sobre a actual duração dos cursos - se é ou não conveniente fazer o mestrado - e se o novo modelo de ensino terá ou não vantagens. A verdade é que não conheço o novo modelo. O mais que consegui fazer foi transmitir-lhes, à distância de vinte e cinco anos, a avaliação que faço da minha própria formação universitária. Sobre a fundamental questão do método de aprendizagem, de que em particular os estudantes me falaram, revelando pouco entusiasmo pelas novidades introduzidas por Bolonha, li aqui que «nos termos de Bolonha, o método de ensino deve ser menos centrado na transmissão dos conhecimentos do professor para os alunos, e mais para a orientação dos alunos a buscar informação e reflectir sobre ela.» O problema é saber que informação o aluno deve ser orientado a procurar e, sobretudo, para quê. Ora, a resposta a esta questão torna-se bem mais evidente quando, pesquisando a informação disponível, fui parar aqui: «Tout ce que vous avez toujours voulu savoir sur les relations entre l’Europe, l’ERT, l’OCDE, l’OMC, le processus de Bologne, la stratégie de Lisbonne et la marchandisation de la connaissance à l’échelle européenne et mondiale...» e é mesmo assim. Se tem dúvidas, veja o vídeo.


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Domingo, 29 de Março de 2009
«Uma profissão é essencialmente um contrato social, que obriga à protecção de pessoas e valores vulneráveis por gente especialmente educada e preparada para tal», escreveu o médico e professor João Lobo Antunes (in «O Eco Silencioso», pág.90). Eis uma verdade simples que me parece evidente. Há uns tempos atrás andei preocupada com as ameaças externas a esta verdade fundamental das profissões, mas hoje em dia estou convencida que o pior mal não é o que vem de fora, mas o que germina dentro, como um «Alien». Pior que ignorar que o cumprimento do contrato social que vincula as profissões não deve ser dificultado ou prejudicado pelo desejo de sucesso económico, é desconhecer, em absoluto, os termos desse mesmo contrato, os valores que nos incumbe proteger, os comportamentos mais adequados para esse efeito. Gente especialmente educada e preparada, escreveu o professor, pois, se não sabemos quem somos, como esperar que os outros nos reconheçam?

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Quarta-feira, 25 de Março de 2009
Esta chamada de atenção para a questão subjacente à defesa da limitação da capacidade para advogar nos tribunais superiores - que, aliás, já tinha sido abordada aqui, e em todas as suas vertentes - fez-me recordar uma outra questão, com ela relacionada: aos candidatos ao CEJ pela “via da habilitação académica” já se exige o grau de mestre ou de doutor, ou o respectivo equivalente legal; aos candidatos ao estágio de advocacia continua a exigir-se apenas a licenciatura. Será esquecimento ou a intenção é mesmo deixar assim? Ainda a propósito de formação, uma outra nota, suscitada pela notícia que encontrei aqui: julgo não me enganar quando afirmo que os advogados e os solicitadores são das poucas, senão mesmo as únicas profissões em Portugal cujos «actos próprios» estão definidos e regulados por lei especial. Neste contexto, fará sentido a associação pública que representa os advogados «promover» formação em áreas de actividade não incluídas nos actos próprios?



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Segunda-feira, 23 de Março de 2009
Para que conste, sei que há «(...)discriminação no emprego, cuidados de saúde inadequados, violência doméstica, leis antiquadas que bloqueiam o progresso (...)».Tudo isso, efectivamente, existe, e é profundamente injusto, independentemente do sexo, raça, idade ou qualquer outra categoria ou género em que possamos classificar as vítimas. Depois, há sobretudo a pobreza, a dura pobreza, a material e a do espírito. Não se percebe bem qual delas estará em causa aqui, provavelmente ambas...


publicado por Nicolina Cabrita às 22:01 | link do post | comentar

Sábado, 21 de Março de 2009
A Fantástica Livraria da minha infância era composta por muitos livros sobre os anos da Grande Guerra [a II, claro], época histórica da predilecção do meu Pai, e o mundo que daí resultou. Recordo em particular a autobiografia completa do Churchill, meia dúzia de volumes encadernados a vermelho, em inglês, sobre os quais passava às vezes o olhar, atraída pela beleza da encadernação e o cheiro do papel, e não propriamente pelo conteúdo. Quanto a este, a minha preferência ia para os livros panfletários de Leon Uris sobre a Palestina e a saga dos judeus, durante e após a Guerra. Foi através do «Exodus» - adaptado ao cinema um ano antes de eu nascer - que fiquei a saber o que era um kibbutz, o sionismo, Ben Gurion, o Palmach, e foi esse mesmo livro, «Exodus», que despertou o meu interesse por Israel, a Guerra do Yom Kippur e uma Senhora chamada Golda Meir.
Golda Meir foi primeiro ministro de Israel entre 1969 e 1974, secretário geral do Partido Trabalhista, e antes disso, ministro dos negócios estrangeiros e ministro do trabalho e segurança social. Conta-se que gostava de ponderar as decisões difíceis recolhida na sua cozinha, areando a chaleira. Também se diz que gostava de cozinhar e era frequente dar de comer a quem a visitava, mesmo em assuntos de trabalho. Achava que não havia nada de especial em ser, simultâneamente, primeiro ministro, dona de casa e avó. Sadat, o mítico Presidente do Egipto, designava-a por «Old Lady», como ela própria um dia lhe recordou, aqui. Não consta que alguma vez tenha precisado de «quotas» para fazer tudo o que fez, ao longo da vida. Considero-a, desde a mais tenra adolescência, o exemplo emblemático do que é ser uma «mulher bem resolvida». À minha maneira, e numa escala bem mais modesta, é o exemplo de «bem resolver» que tenho procurado seguir e aquele que aqui deixo apontado, numa interpretação livre das «obrigações» decorrentes desta simpática e amiga distinção, que me foi imposta pela Patrícia! Saravah Patrícia!


publicado por Nicolina Cabrita às 14:37 | link do post | comentar

Domingo, 8 de Março de 2009
No séc V a. C. Péricles terá afirmado que a verdadeira glória para uma mulher é que ninguém fale a seu respeito. Hoje, ao ler a frase, ocorreu-me que o tempo actualiza as ideias de forma bizarra. Retirada do contexto histórico em que foi proferida, traduz na perfeição o que penso sobre aquilo que, em 1910, a Internacional Socialista determinou que se comemorasse no dia 8 de Março. Por princípio não tenho qualquer simpatia por efemérides que diferenciam os seres humanos, seja qual for o pretexto, tal como não aprecio leis que discriminam pessoas em função do género, tanto aquelas que retiravam direitos às mulheres invocando alegadas « diferenças resultantes da (...) natureza e do bem da família"</span>» como as que, apelando à «paridade», garantem igualdades meramente quantitativas. Não vejo razão para afirmar que «as mulheres fazem a democracia melhor», só porque são mulheres, tal como não descortino motivo para aderir àquela ideia do poeta Aragon, de que a mulher é «l'avenir de l'homme». Parecem-me convicções historicamente datadas, «passadistas». Julgo que vai sendo altura das mulheres seguirem em frente.


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Sábado, 7 de Março de 2009
Há duas ou três semanas atrás, pelas dez da manhã, a minha jovem sócia resolveu levantar dinheiro numa caixa multibanco da Av. da República, a caminho do escritório. Depois de introduzir o cartão e teclar o código foi surpreendida por dois adolescentes romenos, que entre puxões e encontrões conseguiram roubar-lhe cem euros. Até há pouco existia ali perto, na Av. João Crisóstemo, uma esquadra da PSP, entretanto encerrada. Presentemente, a mais próxima fica no Campo Grande, pelo que para mais não serviu que para receber a queixa. O «incidente» terminou há dias, quando foi notificada do arquivamento, por impossibilidade de identificar os autores do crime. Lembrei-me desta história quando hoje visionei o programa «Aqui e Agora» da SIC sobre «Crise e Crime», no qual se debateu se Há um novo tipo de assaltos e assaltantes, nascido da crise económica? Ou a crise não serve de justificação? Sei bem que é a recente proliferação de histórias iguais à da minha sócia que mobiliza o interesse dos cidadãos para este tipo de debates quando, na verdade, o problema que interessaria debater é o de saber se a crise não é ela própria um crime, resultante de uma gestão criminosa da economia global, e se os meios que estão a ser mobilizados para a esconjurar não serão ainda mais criminosos que o crime que a gerou, como muito bem referiu, naqueles que foram os dez segundos mais interessantes do programa, o Advogado José António Barreiros. Antes dele, o Juiz Desembargador Rui Rangel havia louvado as virtudes da democracia e referido que, apesar de tudo, os cidadãos devem ter esperança. Talvez devessem, mas sendo este o cenário dos tempos mais próximos, acho difícil que consigam...

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publicado por Nicolina Cabrita às 01:01 | link do post | comentar

Quarta-feira, 4 de Março de 2009
O Governo está «contra [a] leitura literal de estudo que prevê pensões equivalentes a metade dos salários» daqui por vinte anos, leio no JN. Ainda hoje o Ministro Manuel Pinho fez saber que «Portugal goza de uma situação financeira relativamente sólida apesar da crise económica» [AF]. «Relativamente», note-se, que é uma maneira menos óbvia de dizer até ver...

And Now For Something Completely Different, um poema de Clarice Lispector intitulado «Das vantagens de ser bobo» [não confundir com burro!]




Portugueses, inté!


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