É possível recorrer à Literatura para ensinar Direito? A resposta é sim, o exemplo está aqui. Leiam e descubram como Iago, o temível intriguista da peça «Othello», de Shakespeare, cometeu o crime perfeito. Mas será que os estudantes de Direito portugueses ainda sabem quem é Iago, Othello, Shakespeare? Será que tem razão quem defende que está na «altura de invertermos a pirâmide do nosso sistema educativo remetendo muitos dos nossos licenciados para os saberes da antiga 4.º classe» [expressão que retirei de um comentário ao post Bolonha, o paradigma perdido, de Rui Baptista, que encontrei no De Rerum Natura]? E se a resposta for sim, no que aos Advogados concerne, será que esta é a melhor solução? I wonder...
A Maria Josefa Paias, do Restolhando, gentilmente fez saber ao mundo que «vale a pena ficar de olho» neste Ângulo. Eu agradeço, está claro, e desta vez retribuo, porque não tenho dúvida que o Direito e Avesso, da mesma Autora, é que merece mesmo ser seguido.
E quais são os blogs que eu tenho sempre debaixo de olho? Há uns que leio com regularidade mas que vou abster-me de nomear, por já estarem «na mira» da blogosfera inteira. Outros, na minha modesta opinião, igualmente bons, talvez não tanto. São eles:
Em tempos idos, algures entre os anos de 1982 e 1987, escreveu o Embaixador José Cutileiro, sob o pseudónimo A.B. Kotter, a propósito das «Mudanças de Governo» portuguesas: «O mal é vocês mudarem tantas vezes de Governo», atalhou o Lowater. «Desde 25 de Abril de 1974 este país teve dez primeiros-ministros. São primeiros ministros a mais». «A mais ou a menos», contrariou o senhor J. Fonseca, metendo-se na conversa. Todos nós nos virámos para ele, espantados com a impertinência. Sem se perturbar, o ex-comando esclareceu. «Depende do intervalo que o senhor professor considerar para o cômputo. É verdade que, se contar desde Abril de 1974 até agora, chega a dez chefes de Governo, o que é de mais, mas se contar desde 1932 não passa de doze, o que é de menos. Doze primeiros-ministros em cinquenta e três anos não me parece ofender os padrões europeus». [«Bilhetes de Colares, 1982-1998», Assírio & Alvim, p.68] Tenho uma teoria, só minha, segundo a qual a vida é como os crepes: tem sempre dois lados. Lembrei-me dela ao ler este «bilhete», tão actual, do Embaixador Cutileiro, nesta semana em que vou ter de me virar do avesso para ver se descubro, esquecido nalguma prega de mim mesma, um resquício de vontade de exercer o meu direito de voto...
Carlos Narciso, no «Escrita em dia»: «(...) É raro um jornalista ter tempo para apurar uma história, certificar-se de que não deixou pontas soltas, encontrar todas as respostas possíveis para a questão. É mesmo muito raro. Investigar leva tempo, tempo é dinheiro do patrão e há cada vez menos tempo para essas coisas. Além disso, nem sempre a história caminha na direcção pretendida. (...)» Não admira que alguém tenha achado que estava a mais na RTP... [Errata: hoje, dia 22, dei conta que escrevi RTP quando devia ter escrito SIC, mas desconfio que para o caso é irrelevante, porque o efeito seria sempre o mesmo...]
Lembraram-me hoje que para a semana há eleições, ou seja, vou ter de ir votar.
Para aqueles que, eventualmente, se interroguem sobre a finalidade das reuniões entre as «figuras cimeiras da Justiça» neste final de legislatura, as últimas notícias têm sido bastante esclarecedoras. O bastonário da Ordem dos Advogados esclarece que se tratou de «discutir e analisar "os principais problemas e bloqueios da Justiça"» [cfr. aqui]. Tal explicação causou estranheza, na medida em que não se percebe bem o que há para discutir com um governo que já não legisla. Perguntado o procurador geral da República sobre o mesmo, eis a resposta: «Acertou-se que se irá propor ao Governo que vier, seja de que partido for, que antes (de se aprovarem) as leis que traçam as grandes linhas haja uma reunião entre o poder politico, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o procurador geral da República e o bastonário da Ordem dos Advogados"» [cfr. aqui]. Desta vez a minha perplexidade resulta da circunstância do ministro pertencer ao governo cessante e não ao governo eleito, pelo que sempre faria mais sentido que, a terem lugar agora, estas conversas envolvessem os líderes de todos os partidos e não o ministro que está de partida. Ou não? Enfim... Pelas minhas contas, só falta mesmo saber o que responderá o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, dr. Noronha do Nascimento. Desconfio que a resposta dele é bem capaz de ser esta: o objectivo da reunião foi permitir aos co-autores autografar os exemplares do livro que irão ser gentilmente oferecidos pelo ministro da Justiça :-)
Nos Cadernos de Filosofia Extravante [um dos blogs onde, ultimamente, tenho encontrado refúgio, cansada que estou de ler comentários sobre comentários de comentários, numa nauseante espiral de manipulação de factos e ideias que parece ter infectado, de forma irremediável, a blogosfera portuguesa] encontrei hoje um texto de Pedro Sinde sobre «a facilidade do mal». Foi dele que, ainda há pouco, me lembrei quando, ao passar os olhos pelos títulos dos jornais, encontrei, no jornal Ionline, esta peça sobre uma das notícias que durante a semana que agora finda mais comentada foi pela intelligentia [como se constata, por exemplo, aqui ]. A excelência do artigo não assenta, como é evidente, na história em si, mas antes na quantidade de informação que disponibiliza e na forma como é «servida» ao leitor. Fez-me vir à memória o que Irene Lisboa explicou aqui, a propósito das suas «Crónicas», designadamente, que nelas se havia subordinado à «observação desinteressada e a uns laivos de crítica». E não será isso o que se espera da Imprensa, seja ela oral ou escrita? Relatar factos, aditando ao relato uns laivos de crítica q.b., apenas o estritamente necessário para induzir o leitor a reflectir sobre o narrado, não é esta a função do jornalista? Perguntarão os entendidos que sei eu para poder dar palpites sobre um mister que não é o meu, para o qual não fui treinada, e de facto assim é. Mas será que algum deles me explica por que razão este foi o único artigo que me fez vislumbrar a realidade que existe para lá das palavras? E que realidade! O mal mais absurdo, na sua forma mais desvairada...
Parece que «durante um ano, e mais ou menos uma vez por mês, Alberto Costa, Noronha do Nascimento, Pinto Monteiro e Marinho e Pinto jantaram juntos e discutiram o estado da Justiça», a convite do primeiro. Destas conversas informais terá resultado um livro, em co-autoria, que «é para oferta e não vai ser posto à venda». Que pena! Não tenho a menor dúvida que seria um best-seller e em ano de eleições sempre seria uma contribuição positiva para a diminuição do défice...